segunda-feira, 5 de abril de 2010

Os três movimentos da cozinha

O texto abaixo foi retirado do blog Comidinhas (http://colunistas.ig.com.br/comidinhas/), da jornalista e colega Alessandra Blanco, com quem trabalhei por cerca de quatro anos no iG (portal do qual é uma das diretoras) e que é uma inspiração enquanto jornalista e chef de cozinha. Vale a leitura!

Por Alessandra Blanco

Gastronomia estar na moda já não é nenhuma novidade. Dos chatos entendedores de vinho à nova onda de receber em casa com jantares requintados. Desde os anos 90, comida ganhou status semelhante ao da moda, e os chefs tornaram-se verdadeiros pop stars.


A novidade agora é que gastronomia é também um movimento, ou três, com posicionamentos bastante diferentes. E, de alguma maneira, você já faz parte de um deles.

O primeiro, e mais divulgado, é o da comfort food ou pop food, aqui vistos de maneira mais ampla do que o purê de batatas da vovó. Nigella Lawson, Martha Stewart, Jamie Oliver e até Alex Kapranos, o vocalista do Franz Ferdinand que está lançando seu primeiro livro de gastronomia, são seus maiores representantes.

Eles levam para as nossas casas informações e dicas de comidas que parecem sensacionais e nada triviais, mas que, no fundo, são bem simples. E podem fazer de qualquer pessoa, mesmo que nunca tenha entrado na cozinha, um astro do fogão. Basta desligar a TV, comprar bons ingredientes e colocar, às vezes literalmente, a mão na massa.

Esse é o grande segredo de Jamie e Nigella: eles são bonitos, famosos, passam uma imagem cool, de pessoas normais que são até bem atrapalhadas na cozinha, mas que fazem muito sucesso com os amigos e parentes com seus quitutes divinos.

Alex Kapranos, então, nem se fala. É o líder de uma das bandas mais legais dos anos 00. E mantém uma coluna em um dos melhores jornais do planeta, o inglês The Guardian, para contar dos pratos que experimenta em restaurantes pelo mundo todo, onde está fazendo shows. De tão divertidas, as colunas vão virar livro.

O segundo _e mais glamuroso_ movimento é o da cozinha científica. Ferrán Adriá, o mais célebre chef do mundo, foi o precursor no seu restaurante El Bulli, na Espanha (a foto que acompanha esse post é da caipirinha-nitro com concentrado de estragão, feita por ele). Mas Homaru Cantu está superando seus limites, no Moto, de Chicago.

Chamada de “discomfort food” pela revista Fast Company, a comida de Cantu tem como ingrediente principal o nitrogênio para transformar sólidos em líquidos, espumas ou geléias e brincar com texturas e percepções. O cardápio do restaurante é feito em um “papel” comestível (uma das idéias do chef para ajudar a eliminar a fome do mundo). Um ovo, com aparência de frito, está, na verdade, congelado. Está também em teste uma idéia de ketchup servido frito, cortado em fatias, com tapioca.

Tudo, dizem, com sabores incríveis e experiências únicas.

O terceiro movimento é o “opt out”, um novo estágio da comida orgânica. A idéia é que comprar comidas orgânicas já não é o suficiente. Até porque, pelo menos nos EUA, elas já entraram totalmente “no sistema”, sendo vendidas em grandes supermercados, como qualquer congelado ou enlatado.

A idéia aqui é mais radical: é o “opt out” (cair fora, numa tradução pessoal) das grandes lojas e sistemas. E trocá-los por pequenos mercados ou produtores locais. Nos anos 90, ouvi uma pessoa dizer que não comia nada que tivesse “rosto”, ou seja, nada de carnes, frangos ou peixes, nem derivados deles. Agora, é o contrário, os adeptos do movimento “opt out” querem comidas com rostos. Mas são os rostos de quem as produziu: pequenos produtores ou criadores locais.

Primeiro, porque querem saber de onde vem sua comida, como legumes, verduras e frutas foram cultivados, ou como frangos são criados, por exemplo. Comer bem virou uma questão de confiança pessoal. E, ainda por cima, tal movimento ajuda a incentivar a pequena economia local, de cada cidade ou região.

A história toda do movimento “opt out” foi capa da sisuda revista “Mother Jones”, que, em geral, trata de questões políticas ou sociais. Mais um sinal de que comida virou assunto seríssimo.

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